As Ilhas Marshall têm população de 60 mil habitantes, número semelhante à quantidade de pessoas em Batatais, no interior paulista. O país da Oceania sofre com o que muitos dos vizinhos do Pacífico também encaram: a possibilidade de sumir com o aumento do nível dos oceanos. O futebol virou instrumento para pautar as mudanças climáticas e, assim, os marsalheses se tornaram o último país a ter uma seleção nacional.
A Federação de Futebol das Ilhas Marshall (MISF, na sigla em inglês) foi fundada em 2021, visando criar uma cultura futebolística, até então inexistente, no país. Com influência dos Estados Unidos, dos quais se tornou independente apenas em 1979, as Ilhas Marshall vêm o beisebol e o basquete com mais popularidade.
“Eu nunca imaginei, honestamente, alguém com a camisa das Ilhas Marshall jogando futebol contra outro país. Especialmente, não imaginei que seria eu”, confessa o atacante Aaron Anitok-Brokken, de 17 anos. “Eu amo jogar futebol. Sei disso durante minha vida toda”, conta.
A ideia do projeto da MISF é implementar o futebol em escolas e transformar o esporte algo comum para os jovens. Há também uma tentativa de resgate. Muitos marshalleses deixam as ilhas, rumo aos Estados Unidos ou à Austrália.
Aaron, por exemplo, atua pelo time de futebol da Clark College, em Washington. “Sempre que digam de onde sou, digo ‘Ilhas Marshall’ e perguntam onde fica”, conta.
Um dos motivos da emigração é também o que impulsionou a criação da seleção. A federação quer trazer olhares do mundo para as mudanças climáticas. O aumento das temperaturas globais faz com que os níveis do mar avancem sobre as terras de ilhas do Pacífico.
Segundo um estudo do Banco Mundial, a projeção de aumento do nível do mar indica que 40% dos edifícios da capital Majuro ficariam debaixo d’água. Isso se alia às tempestades frequentes e dificulta a vida nas Ilhas Marshall.
No começo do ano, foi lançado o uniforme “2030 No-Home”, um trocadilho com a camisa número “Away” (ou uniforme 2) da equipe. A peça buscava representar o avanço do mar sobre as terras do Pacífico. Algumas das fotos do lançamento mostravam a camiseta com buracos, em alusão às pesquisas que apontam a possibilidade de as ilhas desaparecerem.
Isso veio depois do sucesso do uniforme principal, lançado em 2023, ainda antes de o time existir. O modelo foi comprado em diferentes lugares do mundo.
“Esta camisa tem um propósito duplo: celebrar as partes únicas e maravilhosas da nossa nação, ao mesmo tempo em que lembra aos órgãos governamentais que eles devem agir rapidamente para nos ajudar a sermos reconhecidos”, disse o diretor de marketing da Federação de Futebol das Ilhas Marshall, Matt Webb.
A criação da peça tem tudo a ver com a história do futebol. O designer responsável, Matías Otero, é do Uruguai, sede e campeão da primeira Copa do Mundo. “Minha esperança é refletir a importância de respeitar e preservar a diversidade da vida neste planeta, especialmente nas Ilhas Marshall, que são tão impactadas pelas mudanças climáticas. É uma honra estar presente de alguma forma no desenvolvimento do futebol nas Ilhas Marshall”, disse Otero.
Além de elementos da fauna e da flora do país, o uniforme tem o slogan “Nós merecemos prosperar”, uma citação da poetisa marshallesa Kathy Jetnil-Kijiner, militante ambiental.
“A popularidade e o apelo global do futebol nos deram a capacidade única de contar uma história, então aproveitamos esse poder. Queremos que mais pessoas saibam quem são as Ilhas Marshall e queremos educá-las sobre a nossa nação”, conclui Webb.
ESTREIA COM DERROTA NÃO ABALA ILHAS MARSHALL, QUE MIRAM RANKING DA FIFA
Até agosto de 2025, a equipe nacional de futebol nunca havia entrado em campo.
A estreia ocorreu na Outrigger Challenge Cup, torneio da própria federação, realizado na cidade de Springdale, no Arkansas (EUA). Em dois jogos, foram duas derrotas das Ilhas Marshall, em um campo que misturava marcações de futebol e futebol americano.
As Ilhas Virgens Americanas (207ª no ranking da Fifa) golearam por 4 a 0 na primeira partida. O segundo confronto, contra Turcas e Caicos (206ª), foi mais equilibrado, com uma derrota por 3 a 2.
“Outrigger” é como se chama uma canoa à vela, usada pelas populações insulares do Pacífico há milhares de anos. A ideia da federação é que o campeonato, que iniciou no futsal em 2024, também tenha modalidade feminina e de praia no futuro.
A meta desportiva das Ilhas Marshall é integrar o ranking da Fifa até 2030. Um ponto importante para isso é poder jogar mais. Ganha importância, então, o Majuro Track and Field Stadium, na capital Majuro, com capacidade para 2 mil pessoas. O espaço foi inaugurado em 2024 para os Jogos da Micronésia. A estrutura custou cerca de US$ 6 milhões e teve apoio de Taiwan.
“Somos extremamente ambiciosos e queremos oferecer oportunidades ao povo marshallês, promover nossa cultura e aumentar a conscientização sobre os desafios que enfrentamos”, diz o técnico Lloyd Owens.
O britânico acompanha o projeto desde o início, elaborando planos para o futebol masculino, feminino e o futsal, que já tem certa popularidade no país e na Oceania como um todo.
A federação passou a oferecer cursos para a formação de treinadores, supervisionados por Owens. O certificado tem reconhecimento da Concacaf (América do Norte), da Confederação de Futebol da Oceania (OFC) e da Confederação de Futebol da Ásia (AFC).
“A noite antes do primeiro jogo, e eu lembro quando, há mais ou menos dois anos, eu disse: ‘Vou me envolver neste projeto das Ilhas Marshall’. Acho que as pessoas não percebem o quanto é trabalhoso, em dois anos e meio, como foi rápido apenas criar um esporte no geral, em um país distante 16 mil km”, conta o técnico.
Owens, formado na licença Uefa A, tem experiência no futebol de Canadá, Suécia e Reino Unido. No seu país, passou por Chelmsford City, Mansfield Town, Colchester United e Oxford United.
Acompanham o treinador Dean Johnson, Justin Walley e Matt Perrella. O trio tem passagens por diversos locais “lado B” do futebol, como Letônia, Serra Leoa, a Confederação das Associações Independentes de Futebol. Johnson é veterano no futebol universitário dos Estados Unidos.
A ideia de orgulho e ambição citada por Owens também vai no sentido de busca por marshelleses fora do país, o que impulsiona o plano da seleção para a criação de campos de treinamentos no exterior. Por enquanto, há um formulário para que os atletas demonstrem interesse.
Entre os 20 atletas que participaram dos primeiros jogos, apenas dois de fato nasceram nas Ilhas Marshall. Já os nascidos nos Estados Unidos são 14. Há, ainda, os que nasceram em Ilhas Salomão (2), Inglaterra (1), Kiribati (1) e Japão (1).
Além da geografia, a idade também tem grande amplitude. O atleta mais velho é o goleiro Jonathan Koehler, de 43 anos. Já o mais novo é o defensor Zach London, de apenas 15.
Muitos dos atletas não têm clubes pelos quais joguem oficialmente. O garoto London, nascido em Majuro, integra a Academia Internacional do Liverpool, em Michgan, nos Estados Unidos.
Outros atuam no futebol universitário do país norte-americano. Uma exceção é o meia David Nigro, de 30 anos, que joga pelo Jackson Lions, da quarta divisão profissional dos Estados Unidos.
Ilhas Marshall sofreram com testes de bomba atômica dos EUA e até hoje sediam uma base militar americana
Ao todo, cinco ilhas e 29 atóis (formação de coral), além de 1.220 ilhotas, compõem as Ilhas Marshall. A maior altitude é de seis metros acima da maré alta. De avião, são três horas até Guam, outro território da Oceania, cinco até o Havaí e sete até a Austrália.
Uma das ilhas é Kwajalein, onde fica uma base do exército americano. A história entre os países data do pós-Guerra, em 1946. Na época, os Estados Unidos realocaram os moradores do Atol de Bikini para o local campo de testes para bombas atômicas. Isso durou até 1958.
A maior explosão aconteceu no teste de Castle Bravo, em 1954. Habitantes de ilhas vizinhas sofreram com efeitos da bomba, que chegou a ser mil vezes mais potente que a explosão em Hiroshima, ao fim da Segunda Guerra Mundial.
Por: Estadão Conteúdo
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