Justiça climática é causa ou oportunidade? Duas gestoras já apostam fichas na tese


A justiça climática é uma causa para ativistas socioambientais, mas ainda pouco conhecida no mercado financeiro e irrelevante critério para investimentos de impacto – segmento com cerca de US$ 1,5 trilhão em ativos alocados globalmente, segundo a rede global GIIN. No Brasil, duas gestoras incluem o tema como tese apesar dos desafios.

Levantamento feito pelo Laboratório de Inovação em Justiça Climática e publicado no Relatório Inovações em Justiça Climática, organizado pela Climate Ventures, identificou 374 instituições que atuam no financiamento climático nas Américas. Desse total, 12 expressam explicitamente “justiça climática” como critério central para alocação de recursos. Quando o recorte se restringe ao Brasil, a lista fica somente com as gestoras Fama re.capital e Vox Capital.

“Justiça climática é uma causa, mas ainda não é uma oportunidade de mercado”, avalia Daniel Contrucci, cofundador e diretor executivo da think and do thank Climate Ventures, em entrevista ao Broadcast Investimentos. Com o Laboratório, a ideia foi reunir especialistas, ativistas e instituições para definir o termo e encará-lo como uma agenda transversal a diferentes setores. Isso num mundo em que a sigla “ESG” já tem sido abandonada e o desenvolvimento sustentável é colocado em xeque. “Transição justa” tem sido um termo alternativo para abrir diálogos. Contrucci diz que “justiça climática” não é uma tese disseminada.

Sarah Siqueira, gerente do Laboratório, acrescenta que, para além da produção de conhecimento, a proposta é fomentar o nascimento e fortalecimento de negócios que geram externalidades positivas. “Olhamos para os negócios que mais transformam a vida das pessoas nos territórios em que atuam, com capacidade de adaptar e mitigar mudanças climáticas”, diz Siqueira, destacando ser um caminho para os gestores de venture capital (VC), por exemplo, tomarem “risco de verdade” no longo prazo.

Oportunidade vem com desafios

A Vox Capital nasceu voltada para o impacto em pautas sociais, mas há cerca de seis anos passou a olhar para a questão climática de forma mais sistêmica, segundo o sócio Gilberto Ribeiro. “Ficou evidente que não existe social ou ambiental; são questões transversais”, diz. Então, como gestora privada, a Vox busca entender como a transição climática pode ser inclusiva socialmente.

Uma primeira tentativa foi com o lançamento de um fundo de investimento nas cadeias produtivas agroindustriais (Fiagros), mirando a restauração do solo no cerrado executada por famílias cooperadas da Cocamar. O produto não foi adiante por falta de captação. Mas Ribeiro disse que no fundo de VC, o Tech For Good Growth I, há investidas com ângulo climático e efeitos sociais, como a Octa, um marketplace de circularidade na cadeia automotiva, e a Nude, empresa de bebidas e alimentos com base vegetal.

O executivo diz ser um desafio para os empreendedores fazer negócios sustentáveis em mercados que não estão necessariamente preparados para isso, ao mesmo tempo em que uma transição exige qualificação, capital e tecnologia. “A solução existe, mas é mais cara. É preciso subsídio e muita inovação para superar barreiras. Mas isso é base para oportunidade. Quem conseguir destravar valor captura retornos superiores”, afirma.

Na Fama re.capital, o FamaGaia Sociobioeconomia FIDC IS concede crédito para pequenos produtores rurais que contribuam para a redução dos impactos negativos da mudança climática, movimentação da economia local e redução das desigualdades sociais. Nove projetos já foram financiados, segundo Andrea Alvares, líder do FIDC. “Justiça climática é reconhecer que existem assimetrias estruturais que fazem com que as pessoas que menos emitem são as que mais sofrem. Oferecer um instrumento financeiro que viabilize e fortaleça comunidades locais que atuam em cadeias da sociobioeconomia busca corrigir essas assimetrias”, afirma Alvares. Porém, ela observa que achar investidores alinhados com a tese ainda é um dos principais desafios. “Tem muita gente com o discurso da vontade de investir, mas não necessariamente alocando dinheiro.”

A Fama re.capital também atua com grandes empresas, nas quais investe para engajar nas jornadas de descarbonização. “Queremos resolver o problema climático com os grandes causadores disso, o que inevitavelmente passa pelos aspectos de justiça climática, especialmente pela forma como as empresas se relacionam com suas cadeias de suprimentos”, diz Caroline Dihl Prolo, sócia e responsável pelo stewardship climático. Com quatro investidas no fundo Climate Turnaround, Prolo destaca haver alinhamento de interesses. “Nunca vamos sugerir algo que destrua valor.”



Por: Estadão Conteúdo

Estadão

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