A derrota do governo na votação da medida provisória que buscava alternativas à alta do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) – a qual sequer foi submetida à votação, ao se aprovar um requerimento que a retirou de pauta, na quarta à noite – resultou em uma sessão mais volátil do que a anterior na Bolsa, nesta quinta-feira, em que o Ibovespa oscilou entre as casas de 141 mil e de 143 mil pontos nos extremos do dia. Por um lado, há a percepção de que “menos” para o governo Lula pode significar “mais” para o mercado, ao não receber um cheque do Congresso para alavancar gastos em ano eleitoral, o que afetaria as chances de renovação do mandato presidencial em 2026 e favoreceria um ajuste fiscal em 2027.
Por outro lado, negativo, o governo precisará encontrar uma “alternativa à alternativa” ao ter a MP rejeitada. E aí surge outra percepção: a de que a solução pode ser a alteração das metas fiscais para este ano e o próximo, o que desagrada ao mercado, já cauteloso quanto à situação das contas públicas.
Entre as opções, estaria a de o governo propor elevação de outras alíquotas de tributação, como observa o economista-chefe da Western Asset, Adauto Lima.
“Do ponto de vista estrutural, a derrubada traz um problema, o do buraco nas contas públicas, que precisa ser endereçado. Mas a aprovação da MP também seria ruim, do ponto de vista alocativo”, diz Lima.
Agora, acrescenta ele, “há risco de o governo optar por mudar a meta fiscal, tanto deste ano como a do próximo, o que traria efeito muito negativo sobre os preços dos ativos”.
“O governo parece não ter aprendido que o Congresso é contra aumento de impostos, e que precisa cortar gastos. O mercado já tinha subido ontem, colocando no preço essa derrota do governo. Como se antecipou tal movimento ontem, o efeito na Bolsa acabou sendo outro, hoje, sem tanto impacto”, diz Luiz Roberto Monteiro, operador da mesa institucional da Renascença.
Pelo lado mais favorável à precificação dos ativos financeiros, “há a leitura de que a derrota da MP reforça a percepção de que a reeleição do governo em 2026 pode vir a ser mais difícil com menos acesso a gastos, o que induz também a chance de algum ajuste de despesas”, avalia Bruna Centeno, economista e sócia na Blue3 Investimentos. “Propostas do governo para tentar ampliar a arrecadação não têm ido para frente”, acrescenta.
Para Tiago Sbardelotto, economista da XP, “o governo pode optar por novo aumento do IOF, restabelecendo grande parte do Decreto nº 12.467/25, mas excluindo operações como antecipação a fornecedores (risco sacado), cuja tributação pelo IOF foi considerada inconstitucional pelo STF por não estar prevista em lei”.
“Todo o conteúdo da MP expirada pode ser realocado em um projeto de lei. No entanto, dada a resistência a algumas mudanças, acreditamos que o governo poderia focar em medidas com maior potencial arrecadatório – como as relacionadas à limitação de compensações tributárias – e em medidas de despesa, fundamentais para manter o teto de gastos”, acrescenta, em relatório do Macro Research da XP.
Na sessão desta quinta, em que o Ibovespa refletiu pouco a leitura relativamente benigna do IPCA em setembro, o índice da B3 fechou em leve baixa de 0,31%, aos 141.708,19 pontos, entre mínima de 141.603,17 e máxima de 143.212,02, saindo de abertura aos 142.148,06 pontos. Moderado, o giro ficou em R$ 18,0 bilhões, após ter mostrado recuperação nas duas sessões anteriores, chegando à faixa de R$ 24 bilhões, na terça-feira. Na semana, o Ibovespa cede 1,73% e, no mês, recua 3,10%. No ano, sobe 17,81%.
Camilo Cavalcanti, sócio e gestor de portfólio na OBY Capital, aponta que o destaque na leitura abaixo do esperado para o IPCA no mês foi uma certa desaceleração de itens ligados a serviços. “Por se tratar de um setor que sofre mais influência da política monetária, e que tem demonstrado um nível ainda alto e incômodo para o Banco Central, a surpresa é um fator positivo, que pode indicar que o juro está começando a fazer mais efeito na economia”, acrescenta.
“O resultado de setembro reforça o avanço do processo de desinflação e pode levar o Banco Central a atenuar gradualmente o discurso de necessidade de manter a Selic elevada por período prolongado”, diz Marcos Vinícius Oliveira, economista e analista sênior da ZIIN Investimentos. “Embora o cenário ainda exija cautela, especialmente diante da persistência dos serviços e das incertezas fiscais, a sequência de leituras mais benignas reduz a urgência de um tom tão restritivo, abrindo espaço para uma postura de vigilância menos dura nas próximas comunicações”, acrescenta, em nota.
No quadro mais amplo, o “início de outubro tem sido bem mais difícil do que o final de setembro para a Bolsa, com ruídos agora, mais uma vez, vindo do lado fiscal, e afetando os preços dos ativos”, diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research. “Dia foi também de realização de lucros no exterior”, acrescenta o analista, referindo-se a leves perdas para os principais índices de ações em Nova York, como S&P 500 e Nasdaq, que vêm de máximas históricas. Por lá, no fechamento, Dow Jones -0,52%, S&P 500 -0,28% e Nasdaq -0,08%.
O petróleo cedeu nesta quinta mais de 1,5% em Londres e Nova York, o que manteve as ações de Petrobras (ON -1,35%, PN -1,44%) na contramão de outras blue chips da B3 nesta quinta-feira. Ao fim, a principal ação da carteira, Vale ON, também oscilou para baixo (-0,15%, na mínima do dia no fechamento), tirando suporte do Ibovespa. As ações dos maiores bancos, à exceção de Itaú (PN -0,16%) no encerramento, avançaram na sessão, com destaque para Santander (Unit +1,32%). Na ponta ganhadora do Ibovespa, WEG (+4,79%), Auren (+3,47%) e Porto Seguro (+1,73%). No lado oposto, Brava (-5,09%), Raízen (-4,35%) e MBRF (-4,27%).
“Apesar de uma abertura mais positiva na B3, no que foi considerado uma vitória do Congresso sobre o governo na questão dos gastos públicos, na noite anterior, a sessão de hoje voltou a ser de realização na Bolsa, com foco no que o governo fará para ajustar as contas, em especial se vier mais uma tentativa de solução pelo lado da arrecadação – o que o Congresso tem rejeitado. Mercado segue atento ao fiscal”, diz Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos.
“Foi mais uma grande derrota para o governo, que contava com medidas de arrecadação da MP para fechar o Orçamento de 2026. Mas os juros futuros caíram na sessão, ajudados também por IPCA mais brando”, diz João Paulo Fonseca, head de renda variável da HCI Advisors.
Por: Estadão Conteúdo