CPI do INSS vira palco para ‘cortes’ de internet e estratégia eleitoral para 2026

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A CPI do INSS está “pop”. Criada na esteira da revelação de fraudes contra aposentados e pensionistas, o colegiado está com audiência em alta, o que tem feito deputados e senadores explorarem os trabalhos em plenário para autopromoção nas redes sociais.

A estratégia geral é aproveitar a indignação com os descontos ilegais para aumentar a visibilidade com a agenda positiva e calibrar um discurso eleitoral para 2026.

Os integrantes da CPI, titulares e suplentes, têm direito a dez minutos que podem ser usados como bem entenderem, seja para fazer perguntas aos convocados, discursar contra ou a favor do governo ou mostrar fotos e vídeos que consideram pertinentes.

De olho nos “cortes” para internet, congressistas têm apelado para discursos inflados, gritos, e performances com alvo certo: cativar o público eleitor no seu Estado de origem. Sem disfarçar, tem deputado que pede a palavra já usando microfone próprio na lapela. Ao lado dele, um assessor se encarrega de gravar com o celular a cena que mais tarde será disseminada nas redes sociais do político.

Alguns transmitem suas participações ao vivo e outros falam diretamente para a câmera que os enquadra na transmissão oficial do Senado.

A avaliação dos assessores é a de que a audiência das transmissões pelos canais oficiais da Câmara e do Senado, as interações nos perfis oficiais e até o volume de telefonemas aos gabinetes durante as sessões indicam elevado interesse popular nos desdobramentos da CPI.

A audiência das reuniões da comissão no canal do Senado no YouTube supera em muito as demais reuniões realizadas nos últimos meses. O aguardado depoimento de Carlos Antônio Camilo Antunes, o Careca do INSS, apontado como figura central do esquema investigado, teve 838 mil visualizações. As sessões deliberativas do plenário do Senado têm cerca de 10 a 15 mil exibições.

A exposição já começou a render frutos. O presidente da CPI, senador Carlos Viana (Podemos-MG), e o relator, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), que têm tempo livre para intervenções tiveram incremento no número de seguidores nos perfis oficiais na internet. Em junho, Gaspar era acompanhado por 218 mil no Instagram. Em setembro, são 360 mil. Viana tinha 136 mil seguidores. Agora, 234 mil. O relator tem planos de concorrer ao Senado em 2026. O presidente quer a reeleição.

A postura dos parlamentares durante as reuniões, com vistas à geração de trechos que serão cortados sob medida para as redes, costuma ser motivo de discussões. O relator adotou a estratégia de conduzir seu interrogatório de pé, com o auxílio do telão da sala de comissões que exibe a própria logomarca: “Alfredo Gaspar na CPI do INSS”.

O deputado Alencar Santana (PT-SP), reclamou da postura. “Eu tenho certeza de que ele vai utilizar isso na rede social, querendo fazer propaganda. Está utilizando a CPI para fazer propaganda eleitoral”, disse.

Na reunião seguinte, o relator provocou o petista: “Queria dizer que, a pedido do PT, eu mandei melhorar a minha logomarca”.

Não só a conduta no plenário, mas as próprias publicações já viraram assunto da CPI. O deputado Coronel Chrisóstomo (PL-RO) usou seu perfil oficial para dizer que governistas “blindaram bandidos” ao rejeitar requerimentos. O coordenador da bancada do governo na CPI, Paulo Pimenta (PT-RS), levou os posts impressos e uma briga foi iniciada.

“Não vai ser o ‘Sargento Pincel’ que vai vir aqui gritar e achar que pode intimidar alguém distribuindo mentiras na internet”, disse o petista.

A oposição saiu em defesa de Chrisóstomo e prometeu endossar a publicação dele. “Os 19 que votaram contra, todos ligados ao governo, que prestem conta. Eu, hoje, faço questão inclusive de falar mais tarde nas minhas redes quem votou e de que forma, mais uma vez”, disse o deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS).

Chrisóstomo é um dos mais exaltados ao microfone e não poupa o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nas redes sociais, costuma publicar vídeos de suas intervenções, às vezes filmados em ângulos diferentes.

Um dos seus mais populares é introduzido com um título em letras garrafais: “Petista surta quando é falado que governo Lula é manchado pela corrupção”. A gravação foi feita durante o depoimento do empresário Fernando Cavalcanti, que tinha se recusado a responder perguntas.

“Já fizeram isso no mensalão, no BNDES, e agora esse governo está fazendo isso com os velhinhos do nosso País. Eles não gostam de trabalhar, gostam de dinheiro dos outros. Eu sou de Rondônia, lá o povo gosta das coisas certas”, gritou. O vídeo teve 128 mil visualizações. Reeleito em 2022 com 24,4 mil votos, o deputado está no segundo mandato.

Em busca da reeleição, o parlamentar admite que o tema do esquema do INSS tem atraído para ele um holofote inédito. “As pessoas pedem fotos para tirar foto comigo quando eu chego em Porto Velho. É por causa da CPI”, comentou.

O presidente da CPI, Carlos Viana (Podemos-MG), já identificou a ânsia por holofotes e têm reiterado que não permitirá que a comissão se transforme em um “palco” e em “desrespeito contra quem quer seja”.

O próprio Viana, por sua vez, tem explorado a visibilidade em alta. Nas redes, publica cortes de suas intervenções, embaladas com trilha sonora. Além disso, apresenta na TV Alterosa um programa policial, exibido em Minas Gerais. Nas segundas-feiras, mesmo estando em Brasília, ele vai para um estúdio na área central da capital federal para entrar ao vivo.

No ar, ele emite suas opiniões sobre a investigação parlamentar. “Não vou me calar. Estão tentando parar, mas não vão conseguir. Do que depender de mim, a gente vai até o final”, disse, no televisivo que foi ao ar no final de setembro.

Às quintas-feiras, em razão do volume de atividades na CPI, ele é substituído por um apresentador em Minas Gerais, mas aparece comentando o que aconteceu de mais relevante na comissão naquele dia.

“Começamos a manhã primeiro com uma boa notícia: Polícia Federal em vários Estados brasileiros, busca e apreensão nos principais sindicatos. Gente que estamos citando aqui”, disse Viana, no programa desta última quinta-feira, 9.

Ele ainda deu mais detalhes ao programa sobre o encontro que teve com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça na quarta-feira. “Reforcei o pedido de prisão do advogado Nelson Wilians. Pedi ao ministro que mesmo que ele não decrete a prisão, que o passaporte seja retido.”

O impacto na visibilidade dos membros está refletido nas redes sociais. A deputada Coronel Fernanda (PL-MT), uma das autoras do requerimento de criação da CPI, aumentou o número de seguidores em 213% entre junho e setembro. Naquele mês, ela tinha 42,3 mil seguidores no Instagram – no final do mês anterior, alcançou 132,6 mil.

Como parlamentar que não é membro da comissão, o deputado Delegado Caveira (PL-PA) tem direito a falar por três minutos. Ele só aparece na sala na parte final das reuniões que demoram mais de oito horas para garantir um conteúdo para as redes.

No dia em que um dos convocados saiu o preso, ele editou o trecho em que pedia a prisão imediata da testemunha e juntou com o presidente dos trabalhos determinando a prisão de Carlos Roberto Ferreira Lopes, presidente da Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer). O conteúdo foi visto mais de 130 mil vezes.

Não apenas oposicionistas aumentaram a popularidade. O petista Alencar Santana (SP) teve um aumento de 117% no número de seguidores entre junho e setembro. Ele tinha 66,9 mil seguidores em agosto e terminou setembro com 145,5 mil.

Integrante da “tropa de choque” do governo na CPI e adepto da estratégia de embates pessoais, Santana costuma fazer ataques diretos a integrantes da oposição durante a CPI. Um dos principais alvos é o senador Izalci Lucas (PL-DF).

“Quem fez a emenda acabando com o recadastramento (de associados) foi justamente o senador Izalci”, afirmou, em vídeo divulgado nas redes em setembro. Esse conteúdo tem mais de 700 mil visualizações.

Os ataques a Izalci voltaram a ser feitos na CPI na última segunda-feira, 6, causando nova polêmica, com trocas de acusações generalizadas entre os integrantes. O presidente da comissão precisou intervir.

“Peço aos senhores parlamentares: as questões sobre diferenças de partido, vamos deixar isso para a eleição do ano que vem? Deixa isso para o ano que vem, 2026, porque aí a gente vai ter tempo suficiente para poder falar”, afirmou.



Por: Estadão Conteúdo

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