Corpo em necrotério secreto pode ser de líder religioso desaparecido há 50 anos

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O documentário “The Mystery of Musa al-Sadr”, lançado nesta semana pela BBC, afirma que um corpo encontrado por um repórter em um necrotério secreto poderia ser do clérigo Musa al-Sadr, que desapareceu na Líbia em 1978. Ele era uma figura importante no Líbano, seu país natal, e era conhecido por defender o diálogo inter-religioso e a unidade nacional.

Segundo a BBC, Sadr desapareceu após viajar para a Líbia em agosto de 1978, convidado a se encontrar com o então líder do país, Muammar Kadafi. O Líbano enfrentava uma guerra civil e Sadr queria que Kadafi interviesse para manter a segurança dos civis libaneses. A rede britânica afirma que, após seis dias de espera por um encontro com Kadafi, Sadr foi visto sendo levado de um hotel em Trípoli em um carro do governo líbio e desapareceu. As forças de segurança de Kadafi teriam alegado que ele havia partido para Roma, mas investigações teriam provado que isso era falso.

Sadr defendia os muçulmanos xiitas de seu Líbano, então marginalizados, e tem seguidores fervorosos. Eles lhe deram o título de imã, uma honra incomum. Seu desaparecimento gerou inúmeras teorias, com alguns defendendo que ele foi morto e outros alegando que ele está vivo e detido na Líbia. A BBC aponta que outro fator no desaparecimento de Sadr é a crença de alguns de que o clérigo iraniano-libanês estava prestes a usar sua influência para levar o Irã a uma direção mais moderada quando desapareceu, às vésperas da revolução iraniana.

O documentário apresenta a investigação da rede britânica, que incluiu a análise por uma equipe da Universidade de Bradford, no norte da Inglaterra, de uma imagem do cadáver em questão. A foto foi tirada pelo repórter libanês-sueco Kassem Hamadé, enquanto cobria a Primavera Árabe em 2011. Ele esteve em um necrotério secreto em Trípoli que, segundo uma fonte, poderia conter os restos mortais de Sadr. Ao ver o corpo, o jornalista constatou que se assemelhava a Sadr, apesar da passagem do tempo, e que a pessoa parecia ter sido executada.

A foto foi levada para a Universidade de Bradford porque, nos últimos 20 anos, uma equipe de lá vem desenvolvendo um algoritmo chamado Deep Face Recognition (Reconhecimento Facial Profundo, em português), que identifica semelhanças complexas entre fotos e se mostrou confiável em testes. O software atribui uma pontuação geral de 0 a 100 às fotos e, quanto maior o número, maior a probabilidade de ser a mesma pessoa ou um membro da família. A foto em questão obteve pontuação na faixa de 60: uma “alta probabilidade” de ser Sadr, segundo o professor Hassan Ugail, que lidera a equipe.

A BBC afirma ter apresentado seus resultados de reconhecimento facial ao filho de Sadr, Sayyed Sadreddine Sadr, mas ele descartou a descoberta, afirmando que tem informações depois da data (2011) de que ele continua vivo. Entre os que acreditam que Sadr ainda vive está a organização fundada por ele na década de 1970, agora um partido político xiita libanês chamado Amal – segundo a BBC, essa crença tem grande poder unificador para muitos xiitas libaneses.

O chefe do Amal e presidente do Parlamento do Líbano é Nabih Berri. De acordo com a BBC, o repórter que viu o corpo e tirou a foto em 2011 também teria extraído folículos capilares para testes de DNA e entregado ao gabinete de Berri, mas ele nunca teve uma resposta. O Amal teria informado ao governo libanês que a amostra foi perdida devido a um “erro técnico”.

A equipe da BBC também relata que foi detida na Líbia por vários dias em março de 2023, quando viajaram ao país para conversar com possíveis testemunhas e procurar o corpo. Agentes do serviço de inteligência da Líbia os detiveram e eles foram levados para uma prisão, acusados de espionagem, onde foram repetidamente interrogados. Eles foram libertados e deportados, após pressão da BBC e do governo do Reino Unido.

A BBC afirma que procurou o escritório de Berri e as autoridades líbias para comentários, mas não obteve respostas.



Por: Estadão Conteúdo

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