A crise energética em território goiano pode estar com os dias contados. Durante a sessão plenária de terça-feira, 19, na Assembleia Legislativa de Goiás - ALEGO, foi apresentado um projeto de Lei que prevê a rescisão do contrato de concessão com a Enel Distribuição Goiás. Assinado pelo presidente da Casa, Lissauer Vieira (PSB), e pelo líder do governo, Bruno Peixoto (MDB), o texto pede a encampação do serviço para a Celg Geração e Transmissão (Celg GT) até que haja nova licitação.

Na justificativa, o projeto de Lei cita como principal critério para anulação do contrato entre a Enel e o Governo de Goiás a má qualidade dos serviços prestados pela empresa, bem como a sua negligência diante dos recorrentes fatos. “Não são cortes de fornecimento de energia ou prejuízos pontuais, mas que têm se generalizado em praticamente todo o Estado”, menciona o texto.

Os parlamentares que assinam o documento elencam, ainda, que a ineficiência da distribuidora prejudica serviços essenciais, como atendimentos na área da saúde e de saneamento. O problema também reflete na economia goiana, uma vez que empresários e produtores rurais têm relatado perda de produção - tal cenário relatado pela própria imprensa goiana. Em uma única propriedade rural em Palmeiras de Goiás, por exemplo, foram perdidos 5 mil litros de leite devido à interrupção do fornecimento de energia, que durou cinco dias.

Segundo Lissauer Vieira, a proposta reflete um desejo comum do parlamento goiano de atuar em prol dos interesses da população. O presidente da Casa assegurou a legalidade do projeto de Lei, garantindo que a Procuradoria Geral do Estado e da própria Assembleia Legislativa foram consultadas. “É o caminho que nós temos e vamos até o fim. Não estamos aqui para brincar, mas para cobrar dessa empresa e poder tomar a gestão da Enel aqui em Goiás para oferecer um serviço de qualidade para a população”, enfatizou.

A crise energética envolvendo a Enel Distribuição Goiás vem se arrastando há meses. Ela é alvo, inclusive, de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a qualidade da prestação do serviço. Já foram quase 20 reuniões ordinárias para debater o assunto, inclusive com a solicitação da abertura de inquérito junto à Polícia Civil para investigar o caso. Deputados goianos também deliberam, dentro da CPI, a realização de audiências públicas em diversas cidades do interior.

Problemas recorrentes
Nesta semana, a Agência Goiana de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos (AGR) multou a empresa em R$ 62.115.208,17. Trata-se da maior multa já aplicada à Enel Goiás. A justificativa gira em torno dos vários problemas identificados envolvendo a qualidade do atendimento para alteração de titularidade em estabelecimento comercial; atendimento ao consumidor; faturamento de energia elétrica; devolução de valores por antecipação de obras; e cumprimento dos prazos de pedidos de ligações prestados pela empresa.

Segundo levantamento da AGR e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), somente este ano, a distribuidora já recebeu duas outras multas que, somadas, totalizam R$ 13.469.145,34. A ouvidoria do órgão contabiliza 133.110 contatos de consumidores da Enel Goiás. A maior parte das queixas dos goianos refere-se à falta de energia (29,41%), devolução de valores por antecipação de obras (18,76%), variação de consumo/consumo, elevado/erro de leitura (11,87%), ligação (5,47%) e qualidade de serviços (4,42%).

O que dizem os deputados
A apresentação do projeto de Lei que prevê a rescisão de contrato com a Enel, e sua consequente encampação para a Celg GT, foi o assunto central da sessão plenária de terça-feira.

Lissauer Vieira (PSB)
"Tentamos todas as formas de diálogo [com a Enel], inclusive a CPI da Assembleia, que tentou, junto com o Governo do Estado, um termo de ajuste de conduta há uns dois meses. Mas a gente viu que nada resultou, nada adiantou. A população está ansiosa, está revoltada, está nos cobrando. Nós, como representantes da população, não temos que tomar atitude. E essa atitude minha e do deputado Bruno Peixoto é para mostrar que aqui tem quem representa a população e quem vai fazer com que essa empresa respeite a população do Estado de Goiás".

Bruno Peixoto (MDB)
"Hoje a empresa italiana Enel tem explorado o consumidor goiano e descumprindo o que foi assinado. Não nos resta alternativa, a não ser promover a encampação – o Estado retomar para si toda a administração e devolver a alegria ao povo goiano, para que não haja falta de energia constante. Observamos com imensa clareza que a empresa está desrespeitando a população do Estado de Goiás. Esse [projeto de Lei] é uma medida dura, é uma medida drástica, mas é a resposta do Poder Legislativo, em sintonia com o Poder Executivo. E, se for necessário, a gente vai acionar o Governo Federal, que está a par da situação que ocorre no Estado".

Henrique Arantes (MDB), presidente da CPI da Enel
Eu e o governador [Ronaldo Caiado] pensamos da mesma forma: A empresa não faz um bom serviço. Temos que tomar providências. Se necessário for, vou até recomendar indiciamento e prisão. Se chegar a esse ponto, se for inevitável que isso aconteça, não iremos poder fazer nada. A situação é intransigente. A energia tem piorado, piorado muito".

Cairo Salim (Pros), relator da CPI da Enel
A nossa ideia era encerrar a CPI da Enel agora no final do ano. Fizemos uma reunião 20 dias atrás na sede da empresa com toda a diretoria, com toda a CPI, uma reunião aberta, mas infelizmente a empresa não nos respondeu nas demandas que nós queríamos. Nós queríamos o quê? Que ela agilizasse esse acordo que fez com o Governo de Goiás de investir no nosso Estado. Nós queremos antecipar esses investimentos, e que ela apresentasse algum ganho também para a sociedade. Além dela não ter nos respondido, agora com o início do período chuvoso, estamos tendo problema em todo o Estado de Goiás. Então nós adiamos o encerramento da CPI, vai atravessar o ano para o ano que vem".

Talles Barreto (PSDB)
"A Enel está prestando um serviço ruim. A insatisfação chega a nós, deputados. De Norte a Sul do Estado, o serviço prestado em Goiás é um serviço ruim e ela não fez os investimentos devidos. Essa CPI comprovou isso e nós vamos tomar todas as medidas necessárias, até mesmo via esse projeto apresentado, para que a empresa ou perca a sua concessão, ou tome as providências que nós queremos. Na realidade, a Enel não está cumprindo o que foi determinado no processo licitatório e, assim, prejudicando o povo de Goiás. Unanimemente na Casa, todo mundo está insatisfeito".

Alysson Lima (Republicanos)
"Vejo que a Assembleia está preocupada com a situação, e isso é importante. A Assembleia tem um envolvimento nos temas do cotidiano das pessoas. A CPI da Enel tem deixado um legado. Eu percebo, tanto do presidente quanto dos outros deputados, esse interesse de reagir. Sem dúvida todos os poderes precisam se unir para provocar a mudança de comportamento da empresa".